6 de maio de 2011

A união estável de pessoa do mesmo sexo deve ser reconhecida?

Em busca de alguma informação na internet sobre essa aprovação do STF, localizei a matéria que segue abaixo, publicada no jornal Folha de São Paulo - 11/2006 e na Revista Vida e Família . A mesma reflete uma visão jurídica da inconstitucionalidade do que ocorreu.

FOLHA DE SÃO PAULO – 11.2006 (pág. 3 Debates)
Pergunta: A união estável de pessoa do mesmo sexo deve ser reconhecida?

Tratamentos jurídicos distintos para realidades diversas

A Constituição Federal de 1988, consagra em seu art. 226 uma máxima de pensadores ilustres das mais variadas épocas e tendências ideológicas: a família é a “base da sociedade”. Razão pela qual, conforme tradição de nossas Constituições, tem “especial proteção do Estado”. Essa proteção se dá mediante o instituto do casamento (entre homem e mulher - vide § 5º, art. 226), previsto na Lei Maior e detalhado na legislação cível. A Constituição, ademais, reconheceu, para efeito de proteção do Estado “ a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento” (art. 226, § 3º). A Lei nº 9.278/1996, que a regulamentou, dispõe em seu art. 1º: “É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família.”

 O Código Civil de 2002, no art. 1723, adota o mesmo conceito. Um dos maiores jusfilósofos da atualidade, Karl Larenz, em sua obra clássica, “Metodologia da Ciência do Direito”, leciona que o Direito “desenvolve por si métodos de um pensamento ‘orientado a valores’”. Apesar de não poucos percalços, prossegue a família sendo efetivamente a célula básica da sociedade, em que cada novo ser humano é gerado, da união entre um homem e uma mulher, que lhe transmitem não só o patrimônio genético, como também o psicológico, espiritual, cultural e de valores, constituindo, ademais, a ambiência fundamental para o seu desenvolvimento. É o elo imprescindível entre as diversas gerações que constituem uma nação, e, em amplitude, a humanidade. A união entre pessoas do mesmo sexo é realidade diversa, tanto quanto a aspectos naturais e humanos como em suas conseqüências, o que importa em tratamento diferenciado, não tendo fundamento, pois, a meu ver, a pretensão de aplicação àquela, de regras do casamento ou da união estável entre homem e mulher, não alterando tal situação a invocação a princípios gerais relativos à dignidade humana, igualdade perante a lei, vedação de discriminação, que supõem, quando não exigem, tratamento distinto para situações distintas. É o caso dos impedimentos para o matrimônio (vide art. 1521, CC 2002), em razão dos quais alguns homens e mulheres são impedidos de casar. Entendo, portanto, adequado o posicionamento da mais conceituada doutrina e da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e de outros tribunais brasileiros, que, a exemplo do legislador constitucional e cível não admitem a “união estável entre pessoas do mesmo sexo”. Nesse sentido, v.g., a douta jurista Maria Helena Diniz, que ressalta como primeiro dos “elementos essenciais” à configuração da união estável, a “diversidade de sexo” (in “Código Civil Anotado”). As várias questões decorrentes da união de pessoas do mesmo sexo, que constituiria uma sociedade de fato com características especiais, devem ser resolvidas, no meu entendimento, caso a caso, pelos Tribunais, mediante aplicação de princípios gerais de direito, não se admitindo, entretanto, a transposição pura e simples de regras da união estável entre homem e mulher, como bem decidido recentemente, à unanimidade de votos pela Terceira Turma do STJ. Corroborando tal posicionamento, cabe lembrar a lição de um dos mais insignes juristas brasileiros, Caio Mario da Silva Pereira, a propósito de novos conceitos jurídicos, que me parece aplicável à questão:“É preferível que a elaboração pretoriana vá promovendo sua construção dentro da variedade dos casos da espécie, e destarte permitindo à doutrina uma flexibilidade conceitual mais proveitosa.” (in “Instituições de Direito Civil”, vol. 5). Ademais, tratando-se de fenômeno social relativamente recente, ao menos em suas atuais dimensões, conviria observar sua evolução e conseqüências, tanto em nível individual como social.

Paulo Silveira Martins Leão Junior
Presidente da União dos Juristas Católicos do Rio de Janeiro
Advogado



(Fonte: http://migre.me/4sOOJ e Revista Vida e Família - Revista da Comissão Nacional Familiar - CNPF. Ano 20, nº 84, abril-junho-2011)

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