25 de maio de 2012

Contemplando Maria: O Vaso de Flores


Havia uma mãe que amava estremecidamente a filhinha de dez anos, encantadora, e para demonstrar-lhe o grande amor de seu coração, comprou um vaso de flores tão brancas, cheirosas e puras que era uma delícia, e chamando sua filha lhe disse: Não estás vendo este vaso de flores? Comprei-o para ti, minha filha, para dar-te uma prova do meu amor e se queres dar gosto a tua mãe e também mostrar-lhe teu amor, toma conta deste vaso: rega as flores, bota esterco, corta os galhos inúteis, mata os insetos, que comem os rebentos e eu ficarei conhecendo desta maneira como sabes apreciar o presente de tua mãe.

A dócil menina colocou seu vaso no recanto de uma janela onde se via crescer a planta cheia de vigor e louçania, as folhas apareciam verdes e brilhantes, as flores desabrochavam dia a dia, e seu delicado perfume, embalsamava o ar de toda a casa. O vaso era um encanto!


A cuidadosa menina todos os dias regava a planta, afastava-a do sol quando aquecia demais, limpava-a de insetos vis, que cultivava a planta com toda delicadeza que lhe era possível: uma flor cultivando a outra. 

Infelizmente aconteceu o pior, a menina distraída com outras ocupações, entregou-se a outros afazeres, ocupada em passear com suas amiguinhas, esqueceu a coitada da flor, abandonada ao recanto da janela; depois de uma semana de desprezo, o vaso ficou feio, as folhas amarelecidas, as flores e frutos murchos, os galhos curvados para o chão, e os insetos imundos tinham violado a alvura das pétalas.

Era uma calamidade! Quando a menina voltou a visitar seu vaso, lembrança de sua querida mãe sentiu o coração cheio de mágoa, de tristeza; imediatamente foi a procura de água, regou o vaso, voltou a cuidar dele, e assim as folhas recobraram seu elegante verdor, as flores seus matizes e perfumado odor. Depois sobrevieram à menina outras ocupações; dali em diante não se preocupou mais com as flores e duas semanas depois os galhos ficaram secos, estioladas pelo sol, as folhas amarelas espalhadas pelo chão e as flores comidas pelos insetos. 

Por uma triste coincidência aquela mesma tarde a mãe entrou no quarto da menina e perguntou-lhe: “O que foi feito do vaso de flores?” A menina, corada, não respondeu e quando a mãe viu as flores secas e as pétalas espalhadas pelo chão, compreendeu tudo, foi-se triste e carrancuda e não fez para sua filha nenhum outro presente.

Nossa alma é como um vaso de flores que nos entregou Deus Nosso Senhor, no dia venturoso em que as águas fecundas do santo batismo lavando nosso corpo fertilizaram nossa alma, foi naquele dia que começaram a desabrochar as flores de todas as virtudes, a rosa da caridade, o lírio da pureza, a violeta da humildade, a passionária da mortificação, o girassol da presença de Deus, enfim todas as virtudes. Este foi o vaso de flores que Deus nos entregou, o vaso que recebemos de nossa Mãe do céu com a obrigação de regá-lo com a oração, que é como o orvalho e chuva sobrenaturais, não expô-lo ao sol ardente das ocasiões perigosas, podar, sem dó, todos os galhos inúteis dos frutos profanos, matar os insetos de pecados, enfim conservar o vigor e beleza dessas flores que o sangue precioso de Jesus Cristo fez cair dentro de nosso coração.

Eis a nossa principal ocupação enquanto vivemos neste vale de lágrimas; eis porque os Livros Santos nos convida, a florescer como as flores e a espalhar como elas o aroma do bom exemplo. Infelizmente nos acontece que em razão dos afazeres temporais, e razão de vivermos completamente mergulhados nestas ocupações, que não merecem importância nenhuma, esquecemos os cuidados de nossa alma, daquele vaso de flores; e aquela alma viçosa, elegante que formava as delícias de Deus e dos Anjos ficou quase arruinada. Quando voltamos os olhos para o nosso interior e refletimos seriamente constatamos, com tristeza, o estado de nossa alma: as flores das virtudes, murchas, as ervas dos vícios crescidas com funesto vigor. Aproveitemos essas ocasiões, como a do mês de Maio, para alongar o olhar sobre nossa alma, sobre essa pobrezinha que tantas vezes deixamos esquecida, como a menina da história do vaso de flores.

Agora é Nossa Senhora a chefiar os mimosos cultos dos fiéis, importuna o seu Filho Jesus com suas contínuas preces e súplicas, ela com sua intercessão descerra os tesouros das riquezas celestiais, e faz chover o orvalho divino das graças e inspirações. Maria com natural afã, nos ajuda, nos anima a podar os ramos dos vícios, a matar as cobras dos pecados e nos dá forças para não largar mão de todo este trabalho.

Com certeza virá o dia mais cedo ou mais tarde em que ouviremos a voz poderosa de Deus, Senhor Supremo, Juiz dos vivos e dos mortos, e nos perguntará: o que foi feito das vossas flores? O que foi feita de vossa alma? Acabaram os dias de vossa existência. Todos vós sabeis que fiz tudo pelas vossas almas: reguei-as com meu sangue, fiz chover sobre elas abundantes graças do céu, avisos, ameaças, castigos, enviei pregadores, confessores, bons exemplos. Fiz tudo o que pude! E, além do mais, vos entreguei a minha Mãe, cujo coração é um tesouro inesgotável de compaixão e misericórdia. Que proveito tiramos de tudo isso? Onde está o vaso de flores? Qual a nossa situação se em lugar de flores de virtudes só achasse cardos, espinhos, ervas selvagens dos vícios? Mas, meu Deus, como seria terrível a sentença!

Dirá Deus Nosso Senhor a esta flor seca e murcha, a este arbusto espinhoso que não pode ser transplantado para o Jardim da eterna glória: vá para o fogo eterno! E os Anjos e os ministros de Deus executando a divina sentença carregariam o vaso e os atirariam para as chamas inextinguíveis. E nossa alma, coitada, que custou tantas lágrimas, tanto segue, ao bom Jesus, esta alma feita à imagem de Deus, imensa nas suas aspirações, imortal, formosa como os anjos, e mais preciosa do que pérolas e diamantes, nossa alma que nasceu para ser eternamente feliz nas regiões da glória, lançada no inferno, no abismo da eterna desgraça!

Que ninguém venha protestar que é inoportuno no mês das flores, dos sorrisos, da poesia, falar do inferno, daquelas terríveis chamas, daqueles incríveis tormentos, daquela eternidade infeliz, a lembrança do inferno nunca é inoportuna, nunca é sem proveito; não há pregação tão útil dizia Santo Inácio. Como nós sentimos todos os dias a luta contra as paixões, assim cada dia devemos refreá-las com a consideração das terríveis penas. Desçamos ao inferno enquanto estamos vivos, espantemo-nos com aquelas funestas visões, contemplemos os réprobos mergulhados no eterno sofrimento, ouçamos seus brados de desespero e, enquanto temos tempo, não poupemos nenhum sacrifício, nenhum esforço para evitar uma desgraça que infelizmente é muito possível e até provável para todos nós, se não trilharmos o caminho da santidade.


Reflexão do livro "Contemplando Maria" do Bispo Emérito de Uruaçu-GO: Dom José Silva Chaves

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