Havia uma mãe que amava estremecidamente a filhinha de dez
anos, encantadora, e para demonstrar-lhe o grande amor de seu coração, comprou
um vaso de flores tão brancas, cheirosas e puras que era uma delícia, e
chamando sua filha lhe disse: Não estás vendo este vaso de flores? Comprei-o
para ti, minha filha, para dar-te uma prova do meu amor e se queres dar gosto a
tua mãe e também mostrar-lhe teu amor, toma conta deste vaso: rega as flores,
bota esterco, corta os galhos inúteis, mata os insetos, que comem os rebentos e
eu ficarei conhecendo desta maneira como sabes apreciar o presente de tua mãe.
A dócil menina colocou seu vaso no recanto de uma janela onde se via crescer a
planta cheia de vigor e louçania, as folhas apareciam verdes e brilhantes, as
flores desabrochavam dia a dia, e seu delicado perfume, embalsamava o ar de
toda a casa. O vaso era um encanto!
A cuidadosa menina todos os dias regava a
planta, afastava-a do sol quando aquecia demais, limpava-a de insetos vis, que
cultivava a planta com toda delicadeza que lhe era possível: uma flor cultivando
a outra.
Infelizmente aconteceu o pior, a menina distraída com outras
ocupações, entregou-se a outros afazeres, ocupada em passear com suas
amiguinhas, esqueceu a coitada da flor, abandonada ao recanto da janela; depois
de uma semana de desprezo, o vaso ficou feio, as folhas amarelecidas, as flores
e frutos murchos, os galhos curvados para o chão, e os insetos imundos tinham
violado a alvura das pétalas.
Era uma calamidade! Quando a menina voltou a
visitar seu vaso, lembrança de sua querida mãe sentiu o coração cheio de mágoa,
de tristeza; imediatamente foi a procura de água, regou o vaso, voltou a cuidar
dele, e assim as folhas recobraram seu elegante verdor, as flores seus matizes
e perfumado odor. Depois sobrevieram à menina outras ocupações; dali em diante
não se preocupou mais com as flores e duas semanas depois os galhos ficaram
secos, estioladas pelo sol, as folhas amarelas espalhadas pelo chão e as flores
comidas pelos insetos.
Por uma triste coincidência aquela mesma tarde a mãe
entrou no quarto da menina e perguntou-lhe: “O que foi feito do vaso de
flores?” A menina, corada, não respondeu e quando a mãe viu as flores secas e
as pétalas espalhadas pelo chão, compreendeu tudo, foi-se triste e carrancuda e
não fez para sua filha nenhum outro presente.
Nossa alma é como um vaso de flores que nos entregou Deus
Nosso Senhor, no dia venturoso em que as águas fecundas do santo batismo
lavando nosso corpo fertilizaram nossa alma, foi naquele dia que começaram a
desabrochar as flores de todas as virtudes, a rosa da caridade, o lírio da
pureza, a violeta da humildade, a passionária da mortificação, o girassol da
presença de Deus, enfim todas as virtudes. Este foi o vaso de flores que Deus
nos entregou, o vaso que recebemos de nossa Mãe do céu com a obrigação de
regá-lo com a oração, que é como o orvalho e chuva sobrenaturais, não expô-lo
ao sol ardente das ocasiões perigosas, podar, sem dó, todos os galhos inúteis
dos frutos profanos, matar os insetos de pecados, enfim conservar o vigor e
beleza dessas flores que o sangue precioso de Jesus Cristo fez cair dentro de
nosso coração.
Eis a nossa principal ocupação enquanto vivemos neste vale de
lágrimas; eis porque os Livros Santos nos convida, a florescer como as flores e
a espalhar como elas o aroma do bom exemplo. Infelizmente nos acontece que em
razão dos afazeres temporais, e razão de vivermos completamente mergulhados
nestas ocupações, que não merecem importância nenhuma, esquecemos os cuidados
de nossa alma, daquele vaso de flores; e aquela alma viçosa, elegante que
formava as delícias de Deus e dos Anjos ficou quase arruinada. Quando voltamos
os olhos para o nosso interior e refletimos seriamente constatamos, com
tristeza, o estado de nossa alma: as flores das virtudes, murchas, as ervas dos
vícios crescidas com funesto vigor. Aproveitemos essas ocasiões, como a do mês
de Maio, para alongar o olhar sobre nossa alma, sobre essa pobrezinha que
tantas vezes deixamos esquecida, como a menina da história do vaso de flores.
Agora é Nossa Senhora a chefiar os mimosos cultos dos fiéis,
importuna o seu Filho Jesus com suas contínuas preces e súplicas, ela com sua
intercessão descerra os tesouros das riquezas celestiais, e faz chover o
orvalho divino das graças e inspirações. Maria com natural afã, nos ajuda, nos anima
a podar os ramos dos vícios, a matar as cobras dos pecados e nos dá forças para
não largar mão de todo este trabalho.
Com certeza virá o dia mais cedo ou mais tarde
em que ouviremos a voz poderosa de Deus, Senhor Supremo, Juiz dos vivos e dos
mortos, e nos perguntará: o que foi feito das vossas flores? O que foi feita de
vossa alma? Acabaram os dias de vossa existência. Todos vós sabeis que fiz tudo
pelas vossas almas: reguei-as com meu sangue, fiz chover sobre elas abundantes
graças do céu, avisos, ameaças, castigos, enviei pregadores, confessores, bons
exemplos. Fiz tudo o que pude! E, além do mais, vos entreguei a minha Mãe, cujo
coração é um tesouro inesgotável de compaixão e misericórdia. Que proveito
tiramos de tudo isso? Onde está o vaso de flores? Qual a nossa situação se em
lugar de flores de virtudes só achasse cardos, espinhos, ervas selvagens dos
vícios? Mas, meu Deus, como seria terrível a sentença!
Dirá Deus Nosso Senhor a
esta flor seca e murcha, a este arbusto espinhoso que não pode ser transplantado
para o Jardim da eterna glória: vá para o fogo eterno! E os Anjos e os
ministros de Deus executando a divina sentença carregariam o vaso e os
atirariam para as chamas inextinguíveis. E nossa alma, coitada, que custou
tantas lágrimas, tanto segue, ao bom Jesus, esta alma feita à imagem de Deus,
imensa nas suas aspirações, imortal, formosa como os anjos, e mais preciosa do
que pérolas e diamantes, nossa alma que nasceu para ser eternamente feliz nas
regiões da glória, lançada no inferno, no abismo da eterna desgraça!
Que
ninguém venha protestar que é inoportuno no mês das flores, dos sorrisos, da
poesia, falar do inferno, daquelas terríveis chamas, daqueles incríveis
tormentos, daquela eternidade infeliz, a lembrança do inferno nunca é inoportuna,
nunca é sem proveito; não há pregação tão útil dizia Santo Inácio. Como nós
sentimos todos os dias a luta contra as paixões, assim cada dia devemos
refreá-las com a consideração das terríveis penas. Desçamos ao inferno enquanto
estamos vivos, espantemo-nos com aquelas funestas visões, contemplemos os
réprobos mergulhados no eterno sofrimento, ouçamos seus brados de desespero e,
enquanto temos tempo, não poupemos nenhum sacrifício, nenhum esforço para
evitar uma desgraça que infelizmente é muito possível e até provável para todos
nós, se não trilharmos o caminho da santidade.
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